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Companheira Dilma Rousseff: a saída (sempre) é pela esquerda


«O que é bom para a Argentina, não é bom para o Brasil», diria algum embaixador brasileiro que andou pelos Estados Unidos, se o velhaco já não fosse falecido e se a ditadura militar ainda estivesse no poder. Como fervente defensor das relações íntimas a qualquer preço com o imperialismo estadunidense, esse embaixador certamente não veria com bons olhos qualquer tentativa de associação entre países subdesenvolvidos. Para ele, a única opção seria o Norte e o resto... Bem, o resto não é problema do Brasil. «Cada macaco no seu galho!», gritaria aquele embaixador baiano. E todo mundo bateria continência, sim senhor!

Mas os tempos mudaram, felizmente. A ditadura já é peça de museu e a esta altura do campeonato essas ideologias submissas estão em baixa no mercado. Hoje existe um reconhecimento da necessidade de fortalecer as relações entre os países latino-americanos fora da órbita e da influência das potencias centrais da Europa e da América do Norte. Temos o MERCOSUL, a CELAC e a UNASUL, mecanismos para alcançar uma perfeita integração económica, social e política dos países da região. Parece que estamos começando a entender que o futuro é aqui e agora, no sentido literal da expressão.

Mas se a solução para os problemas do Brasil não está nos Estados Unidos (nem na Europa), onde está então? Pois bem, só pode estar em dois lugares: ou dentro do próprio Brasil, como sustentam os ufanistas, ou não muito longe, aqui mesmo no continente (o que viria a ser a extensão do Brasil que fala espanhol, na opinião de outros ainda mais ufanistas). Seja como for, a verdade é que o Brasil hoje tem problemas políticos e sociais (porém não econômicos) muito graves. Quem poderá ajudar a solucioná-los?

Talvez a resposta esteja muito mais perto do que se pensa. Que tal se damos uma olhada em alguns exemplos recentes de como a vizinha Argentina, por exemplo, conseguir sair de seus imbróglios no campo da política?

  • Março de 2008: produtores rurais de todo o país resolvem fazer um lock-out para protestar contra uma iniciativa do governo argentino de incrementar as retenções (uma modalidade de arrecadação de impostos) sobre as exportações de soja e de girassol. Durante os quase cinco meses do lock-out houve desabastecimento, bloqueio de estradas, fechamento de portos e princípios de caos social, e isto gerou desestabilização política, colocando o governo contra as cordas e à beira do nocaute. Em vez de ceder à chantagem dos grandes latifundiários, a presidenta Cristina Kirchner ―que havia assumido seu mandato poucos meses antes, em dezembro de 2007― saiu pela esquerda, anunciando a nacionalização do sistema de previdência social, que havia sido privatizado nos anos 90. A partir daquela privatização, os trabalhadores deixaram de ter cobertura estatal para suas aposentadorias, passando a depender de empresas privadas que não administraram muito bem o dinheiro. Com a reestatização, todos voltaram a aposentar-se pelo Estado nacional, o que foi percebido pela população em geral como uma garantia de estabilidade que as empresas privadas não davam.
  • Junho de 2009: a oposição obtém uma importante vitória nas eleições legislativas, deixando o governo grogue outra vez. Muitos analistas consideraram que, sem apoio no Congresso Nacional, a queda de Cristina Kirchner seria uma mera questão de tempo. Mas a presidenta tinha um par de ases na manga e saiu do aperto, uma vez mais, pela esquerda. Por um lado, ordenou que a transmissão dos jogos da primeira divisão do futebol passasse à televisão aberta. Antes disso, para ver futebol na Argentina era preciso pagar um pay-per-view e nem sequer os gols da rodada podiam ser mostrados pelos canais abertos ao público. Como no Brasil, o futebol é um elemento fundamental da cultura popular e a possibilidade de ver as partidas sem pagar pelo serviço foi recebida pelas classes populares como um presente dos deuses. Além disso, Cristina Kirchner anunciou a criação da Asignación Universal por Hijo (um programa similar à Bolsa Família brasileira). Com esta medida tão popular, o governo passava a atender diretamente às camadas mais vulneráveis da população, oferecendo-lhes um beneficio social que fazia toda a diferença entre não ter nada para comer e passar ter três refeições por dia. Como pode imaginar o atento leitor, a oposição nem teve tempo de saborear o triunfo nas eleições: poucos meses mais tarde a popularidade de Cristina Kirchner já estava de novo nas nuvens.
  • Fevereiro de 2012: um acidente ferroviário em Buenos Aires deixa como saldo 51 mortos e mais de 700 feridos. Na Argentina este tipo de tragédia tem um alto impacto político, pois os trens são uma polêmica concessão do governo às empresas privadas e a população tende a responsabilizar os dirigentes políticos por qualquer acidente que ocorra. Neste caso, a comoção social foi enorme e Cristina Kirchner não titubeou em estatizar ferrovias e em anunciar fortes investimentos no setor, para melhorar a qualidade do serviço prestado. Também anunciou a estatização da YPF ―equivalente à Petrobras na Argentina―, outra empresa que havia sido privatizada nos anos 90 e que, na percepção de um setor amplo da sociedade, nunca deveria haver saído das mãos do Estado nacional.

Os três casos acima citados são clássicos exemplos de como o governo argentino vem resolvendo suas contingencias políticas. Claro que para cada situação, como reza o manual do bom político, foi aplicada uma solução diferente, pois não é recomendável tratar todas as doenças com o mesmo antibiótico. Mas existe algo em comum entre todas as respostas de Cristina Kirchner às crises emergentes: sempre a saída foi pela esquerda, ou seja, todas as medidas adotadas foram de caráter popular. Nunca se apelou à repressão, ao recorte de gastos ou a ajustes econômicos e a demissões no setor público.

E o resumo da ópera é que, se um setor da sociedade brasileira sai às ruas para protestar contra o aumento das tarifas do transporte público, isto é uma contingencia. Parece possível sair dela pela direita, pospondo o aumento para dentro de três ou quatro meses e, enquanto isso, mandar a policia para reprimir os manifestantes. Mas já sabemos que esta não seria uma verdadeira saída, já que serviria apenas para empurrar o problema com a barriga. Se a companheira Dilma Rousseff quer dar ao problema uma solução efetiva, essa solução é pela esquerda: anunciar a implementação de subsídios para o transporte público de passageiros em todo o país, por exemplo, reduzindo a tarifa paga pelo trabalhador e repassando os custos ao contribuinte. Com isto, os mais ricos pagam a passagem dos mais pobres e temos aqui uma maneira indireta de ir redistribuindo a riqueza num dos países mais desiguais do mundo.

Já sabemos que a classe média é instável, volúvel e facilmente manipulável pelos meios de comunicação. Essa classe média certamente voltará a sair às ruas quando seus patrões, os mais ricos, decidam que é hora de dar um basta nessa história de pagar a passagem dos mais pobres. A classe alta utilizará seus meios de comunicação para transmitir a ordem e a classe média protestará contra a política, com as mesmas desculpas esfarrapadas e com a mesma máscara apolítica de sempre. Mas então a classe média cai na armadilha e se coloca a si mesma em uma grave contradição, já que não é possível querer e não querer a mesma coisa ao mesmo tempo, neste caso, transporte mais barato. E assim se vão desativando as bombas que a direita neoliberal vai colocando no caminho do progressismo.
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